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5 de março de 2017

POR QUE NÃO UM QUARTO PODER PARA UNIR A CULTURA DOS POVOS ?



- Dilmar Paixão –
(professor, escritor e poeta)

               Casualmente, este sítio (ou site “para os mais chiques”, como pronuncia o povo da minha terra,) tem o sobrenome de “Pampeano”. Ora, o Jornal Virtual Chasque Pampeano, inteligente iniciativa do Paulo Guimarães, ao surgir ainda em dezembro de 2006, veio com a missão de ser um informativo cultural e jornalisticamente atualizado, opinativo e coerente com a realidade, além de expressar a preocupação de tantos com a preservação dos valores sociocomunitários contemporâneos e tradicionais.
O pampa, ou a pampa para os mais fronteiristas, de há muito não respeita fronteiras com países vizinhos. A música é o mecanismo mais natural de transposição desses limites geopolíticos. E foi por acaso, porque os anúncios são raros dos produtos de qualidade - lamentavelmente, que, após o Galpão Crioulo, mudei o canal para o Galpão Nativo neste domingo. Em uma marca televisiva, o Neto Fagundes e a Shana Muller; no outro, o Elton Saldanha recebendo o Luis Carlos Borges. Esses amigos e companheiros de esforços são alguns dos nomes do trabalho elaborado do regionalismo gaúcho voltado à expansão universal sem depender da ajuda das instituições que a isso deveriam se dedicar. É preciso mais do que boa vontade dos dirigentes. Competência é um fator escasso?
Como declarei em outras oportunidades, o Borges é um dos principais nomes a merecer o reconhecimento pela luta inegável em prol da integração artística com os povos latino americanos. No programa, ele comentou que foi a partir de 1960, ainda muito jovem, que percebeu gaiteiros representativos dos missioneiros, como o Tio Bilia, sem executar melodias como o chamamé. Isso o motivou a se aproximar do ritmo que tem a sua moradia mais tradicional em Corrientes na Argentina. Com os costados do Borges, grandes artísticas chamameceiros participaram do programa coordenado pelo Elton. Enquanto a TVE – Educativa, como se denomina – puder resistir à incoerência do governo Sartori e políticos contraditórios que pretende extingui-la, esse programa pode ser revisto e é uma recomendação que faço para quem gosta de ouvir arte com qualidade.
O destaque deste texto reflexivo no Chasque Pampeano tem o propósito de sublinhar e tornar maiúscula a observação feita pelo Antonio Tarragó Ros durante a sua participação no Programa Galpão Nativo. Em meio à conversação, Tarragó comentou que os governos dos povos têm, geralmente, uma estrutura organizada para o Estado com três poderes: poder executivo, poder legislativo e poder judiciário. O que ele argumenta é que, no interesse da valorização dos povos em suas regionalidades territoriais, seja estabelecido um quarto poder. Para ele, o poder cultural será o único capaz de acrescentar essas garantias, praticamente espontâneas, porque nascem das manifestações populares e tradicionais das gentes de cada localidade.
De há muito, para nós gaúchos e brasileiros, comenta-se a existência desse quarto poder, admitido, mas não institucionalizado, no poder da imprensa e, em si, dos veículos de comunicação. Os monopólios dessa área são riscos evidentes. Portanto, seja como quarto ou quinto poder, quero sublinhar essa visão que, ainda bem, começa a crescer com focos em muitos lugares do mundo das Américas. Por que não um poder cultural entre os povos?
Boaventura de Sousa Santos tem percorrido os meios acadêmicos combatendo a inconsciente defesa e o incentivo aos interesses serem voltados ao norte, notadamente, o norte americanismo. Sobram exemplos, como a metodologia científica universitária, ao exigir nos projetos e trabalhos que se exponha uma questão “norteadora”. A isso, Boaventura menciona o “sulear”, ou seja, a ecologia dos saberes direcionadas também aos valores do sul, como a autovalorização e a consciência sulamericana.
Freire, tão associado às intenções e práxis do construtivismo, defende o diálogo interativo em moldes de rodas de cultura. Assim, denomina o que, muitas vezes, se tem praticado como rodas de conversa nos encontros científicos ou ações interdisciplinares e com as comunidades.
Neste instante, quero aproveitar a oportunidade lembrada pelo Tarragó para incentivar mais dedicações e denúncias por esses valores. Também, os tradicionalistas sabem do valor da cultura. Está na própria Carta de Princípios do Movimento Tradicionalista. No entanto, entre a letra fria dos regulamentos e publicações textuais com a prática do cotidiano dos tradicionalistas, há vales quase instransponíveis, porque o Barbosa Lessa segue muito atual na certeza de que “embora seja um Movimento de massa, o Tradicionalismo – sempre – será compreendido por uma minoria intelectual”. Aos seus dirigentes não compete tão somente ceder espaços e, sim, impulsioná-los fisiológica e epistemologicamente. Aí, continua residindo o principal obstáculo: poucos têm o interesse em que essas distâncias e óbices sejam reduzidos. O discurso não é a prática, com certeza. Inúmeras ações gestoras podem comprovar com facilidade essa situação de descaso e de privilégios individualizados.
O que a cultura pode acrescentar às pessoas são conjuntos de compreensões e iniciativas emancipatórias. Pessoas livres não são manobradas com a mesma domesticação. Se estiverem atentas e conscientes, então, não há argumentos capazes de demovê-las do direcionamento que escolherem. Os dirigentes e os governos – indistintamente, todos – sabem e se aproveitam disso. Se dependermos dessas intenções, os passos serão mínimos. Ninguém tenha dúvida.
Unir a cultura dos povos será, sim, um poder incomensurável! Não há medidas capazes de saber e dimensionar a força desses sentimentos e sedimentos que reúnam os povos por seus fatores culturais. Além disso, se cada local valorizar a sua cultura, mais raízes serão aprofundadas. Com a lateralidade do universalismo cultural se garantirão outras forças de resistências às tentativas do escravismo e da exploração.
Quando se têm notícias de cortes de verbas, de encerramento de espaços de divulgação dos assuntos comunitários como a TVE e do imperialismo ou neoliberalismo que transforma em número e quantidades todas as coisas, o lucro de uns será a perda de muitos. Entendo as necessidades revisionais dos intuitos gestores e dos programas governamentais, como percebo a importância de que os poderes formais do executivo, legislativo e judiciário precisam análises, avaliações e atualização de suas propostas e mecanismos, inclusive, nos espaços intra e interinstitucionais.
Contanto, a responsabilidade que tem sido assumida pelos artistas, leiam-se poetas, musicistas, cantores e intérpretes em geral da arte e da cultura dos povos – e de longa data como venho referindo – carece de posicionamentos mais definidos, mais evidentes, mais comprometidos e mais coerentes por parte daquelas pessoas que acessam a cargos, a maioria bem remunerada, e fazem belíssimos discursos sem torná-los efetivos e eficazes como atos de gestão.
Uma ressalva que se desgarra, por derradeiro, serve a essa defesa pela construção de poderes culturais de aproximação e interatividade entre os povos: às vésperas do reinício das aulas, como os governos fizeram muito pouco para preparar os prédios PÚBLICOS das escolas, lá estão pais, mães, alunos, alunas, professores, professoras, demais trabalhadores e trabalhadoras da educação e pessoas da comunidade a pintar e reformar os locais. Percebi que essas iniciativas, elogiadas pelo poder da imprensa, raramente, contaram com cobranças mais fortes e verdadeiramente duras contra a inoperância e insuficiência das ações de quem se propôs e assumiu os encargos públicos.
Sejamos, portanto, mais eloquentes e decididos nas escolhas. Saibamos nos reunir aos interesses leais à cidadania, à cultura e ao bem viver em sociedade. A cultura, um poder forte a nascer da unidade dos povos!


Proseamos mais de outra feita, tomara mais conscientes, participativos e reivindicadores dos nossos direitos!


Partenon, Porto Alegre, 05 de março de 2017.