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23 de maio de 2014

Grafiteiros denunciam abuso de poder da Brigada e Guarda Municipal

 
  Grafiteiros dizem que foram ameaçados

Os grafiteiros Michael Valença Castilho, mais conhecido como Jimmy, e Juarez Fernandes Fonseca denunciaram terem sido detidos arbitrariamente e ameaçados por guardas municipais quando faziam grafitagem no Terminal Triângulo, na Avenida Assis Brasil, na quarta-feira (14/5) passada. A denúncia foi feita, nesta quinta-feira (22/5) pela manhã, aos vereadores da Comissão de Defesa do Consumidor, Direitos Humanos e Segurança Urbana (Cedecondh) da Câmara Municipal de Porto Alegre, durante reunião que debateu também a necessidade de regulamentação da Lei nº 200/2013, que trata sobre o trabalho dos artistas de rua em Porto Alegre.

Jimmy relatou que na quarta-feira passada, por volta de 22h30min, estava grafitando o lado direito do Terminal Triângulo, na Avenida Assis Brasil, acompanhado de Juarez. No lado esquerdo do Terminal, conta Jimmy, estavam dois adolescentes menores de 18 anos fazendo pichação em cima do grafite, o que fez com que o responsável pela segurança do Terminal acionasse a Guarda Municipal.

Ao chegarem ao local, no entanto, os guardas municipais se dirijam diretamente a Jimmy e Juarez, abordando-os, segundo os grafiteiros, de forma brusca e desrespeitosa. “Vamos largar as latas, vai todo mundo em cana”, teriam dito os guardas. Os dois grafiteiros ainda tentaram dialogar, avisando que a grafitagem havia sido previamente autorizada pela Empresa Pública de Transporte e Circulação (EPTC) e pelo próprio funcionário encarregado pela segurança do local. Assim como Jimmy e Juarez, vários outros grafiteiros estariam autorizados a grafitar o local sem necessidade de prévia identificação. “O segurança do local assegurou aos guardas que nós estávamos autorizados, mas eles não se importaram e nos levaram presos.”

Prisão

Jimmy conta que ele e Juarez, juntamente com os dois adolescentes pichadores, foram levados ao Departamento Estadual da Criança e do Adolescente (Deca). No Deca, as tatuagens no corpo de Jimmy teriam chamado a atenção dos policiais, que já os receberam com ofensas. “Começaram a me ofender, me chamar de vagabundo, diziam que iriam bater. Fui humilhado na frente de meu pai e minha mãe. O segurança do Terminal Triângulo foi levado junto ao Deca e, mesmo confirmando a autorização, nos disseram que iríamos ser enquadrados por aliciamento de menor, corrupção de menor e formação de quadrilha.”

Os dois grafiteiros foram levados, então, ao Instituto Médico Legal (IML) para serem submetidos a exame de corpo de delito e, depois, levados ao Presídio Central, onde passariam por triagem. “Disseram que, na quinta-feira, iríamos ‘subir galeria’.” Os dois grafiteiros eram escoltados por dois soldados da Brigada Militar que, segundo Jimmy, o ameaçavam com violência, insinuando inclusive que iriam retirar o seu piercing à força.

Emocionado, Jimmy afirmou que tem “o nome limpo” e nunca havia sido submetido a esse tipo de situação humilhante. Contou que ministra aulas de grafitagem para crianças, ensinando-as a grafitar em paredes livres.”

Depois do IML, voltaram ao Deca, onde teriam ouvido novamente muitos insultos e ameaças. Os dois pichadores já haviam sido liberados, mas Jimmy e Juarez foram mantidos presos e, em seguida, levados à 3ª Delegacia de Polícia, onde os dois rapazes puderam contar a sua versão dos fatos e foram liberados. “A delegada foi a única pessoa a parar para nos ouvir. Ela disse ao guarda municipal que ele tinha agido errado, pois não havia necessidade de fazer aquilo. O guarda disse que isso não importava, pois ele estava fazendo o seu trabalho.”

Jimmy reclama que nunca precisou de autorização para grafitar e disse que uma parcela dos guardas municipais é desinformada e preconceituosa, “Sou pai de família e tenho dois filhos. Agora minha ficha policial está manchada. Eu havia recebido um convite para trabalhar em Orlando, nos Estados Unidos, mas agora não posso sair daqui porque estamos respondendo a processo.”

Confirmando os fatos narrados por Jimmy, Juarez Fonseca contou que sempre trabalhou sozinho, de forma independente, “Trabalho para sustentar minha família e a arte, tenho de comprar as latas. Faço meu trabalho por amor. Tinha ficha limpa e tive de passar por isso.”, lamentou.

Legislação

O presidente da Cedecondh, vereador Alberto Kopittke (PT), elogiou a coragem dos dois grafiteiros em fazer a denúncia e considerou “uma arbitrariedade com tortura psicológica” a detenção dos dois rapazes. “Esses funcionários precisam ser processados. Essa postura dos brigadianos é equivocada. Vamos pedir explicações à Brigada Militar, à Guarda Municipal e outros órgãos públicos envolvidos e encaminharemos denúncia ao Ministério Público e à Defensoria Pública. Queremos uma cidade que não tenha violência nas relações com os artistas de rua. Vamos abrir diálogo com a Guarda Municipal e os órgãos de segurança.”

Para a vereadora Fernanda Melchionna (PSOL), que convidou os dois grafiteiros a darem seus depoimentos à Cedecondh, é preciso garantir que a nova legislação que regula a atuação dos artistas de rua “seja um marco na liberdade e garantia de expressão” desse segmento. “Eles não cobram ingresso.” Ela considerou “emblemático” o caso ocorrido com os dois jovens e alertou para a necessidade de se combater a criminalização da arte. “A grafitagem é uma arte popular reconhecida em grandes centros e no exterior. Essa postura dos guardas municipais é discriminatória.” Fernanda ainda sugeriu que a Cedecondh promova um seminário para discutir a regulamentação da lei que trata da atuação dos artistas de rua.

Para Hamilton Leite, do Oigalé Cultural, a prisão de artistas de rua “é um fato vergonhoso” para a cidade. “É uma forma de poder exacerbada. É possível fazer arte sem repressão.” Ele acredita que a legislação recentemente aprovada já inclui a sua regulamentação. Fábio Cunha, do Sindicato dos Artistas e Técnicos em Espetáculos de Diversões no RS (Sated-RS) e integrante do grupo teatral Falos&Stercus, se disse chocado com o caso narrado pelos grafiteiros e observou que uma sociedade sem arte é medíocre. “O patrimônio imaterial e a arte é o que Porto Alegre tem de melhor para oferecer.”

Representando a Secretaria Municipal de Cultura, Breno Ketzer Saul afirmou que o caso ocorrido com Jimmy e Juarez demonstra a necessidade de se promover uma mudança de mentalidade na sociedade, abrindo o diálogo com os setores encarregados pela segurança pública. “A SMC tem apoiado o teatro de rua desde os anos 1980 e lida diariamente com a arte de rua.”

Já o secretário da Produção, Indústria e Comércio (Smic), Humberto Goulart, e o supervisor de Praças e Parques da Secretaria Municipal de Meio Ambiente (Smam), Léo Bulling, lamentaram o caso narrado pelos grafiteiros, mas alertaram para a necessidade de haver uma regulamentação mais clara para a atuação dos artistas de rua, uma vez que os órgãos públicos recebem grande número de reclamações sobre possíveis abusos cometidos pelos que ocupam espaços públicos.
A vereador Mônica Leal (PP) manifestou preocupação com “a arbitrariedade e abuso de poder” demonstrado pelas forças de segurança no caso relatado pelos dois jovens. “A Cedecondh deve encaminhar o caso também à Corregedoria da Guarda Municipal, além do Ministério Público, Brigada Militar e Polícia Civil.” Ela também defendeu que se elabore uma cartilha explicando a nova legislação que trata dos artistas de rua.

Também participaram da reunião a vereadora Séfora Mota (PRB) e o vereador Mário Fraga (PDT), bem como o presidente do Conselho Municipal de Cultura, Paulo Guimarães, e o coordenador do Centro Administrativo da Região Centro, Rodrigo Kandrik.

Texto: Carlos Scomazzon (reg. prof. 7400)
Edição: Marco Aurélio Marocco (reg. prof. 6062)