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25 de setembro de 2013

A Moda é achar que a cultura se restringe apenas aos limites da Arte

Moda x Lei Rouanet - No embalo e na onda dos alarmistas de plantão, a moda hoje é criticar a Cultura, mesmo que seja sem muita informação e embasamento. Alguém já ouviu falar em economia criativa ?


Texto de Marcelo Miguel* 
Aqueles que atuam e trabalham no setor cultural sempre foram alvos de “certo” preconceito e muito descredito por parte de uma grande parcela da sociedade.
Muitos, por não entenderam a real função da arte e da cultura, creditam para as atividades culturais, uma falta de funcionalidade e uma menor importância se comparadas às todas as outras atividades “produtivas”.
Este preconceito é claramente percebido no dia-a-dia de artistas e produtores culturais, que quase sempre são tratados como “cidadãos de segunda classe”.
Ainda como consequência deste preconceito, o poder público ao pensar e formar sua estrutura administrativa, quase sempre estabelece aos órgãos de gestão cultural um papel secundário, sem recursos, sem valor e sem importância.  Em quase todos os municípios a cultura é um “mero” apêndice de uma série de outras secretarias ou organismos gestores.
Muitos gestores públicos ainda entendem que a Cultura serve apenas como o setor promotor de festas e eventos da cidade.
Sobre o poder público municipal, é comum ao se determinar o orçamento das prefeituras, observarmos que o investimento no setor cultural mal chega a marca de 1% do orçamento global, situação também que se repete nas esferas estaduais e federal.
O discurso que acaba por legitimar todo este quadro é o discurso da “discriminação” e do “preconceito”.  O argumento comum e dominante que encontramos, não só por parte dos órgãos públicos, mas também de muitos setores da sociedade, é de que existem outras prioridades.
Quando levantamos a necessidade dos investimentos públicos no setor Cultural, quase sempre ouvimos a célebre frase: “Os recursos públicos e a atenção da sociedade precisam ser canalizados para a educação e para a saúde!” 
Esta afirmação, repetida e defendida Brasil afora, apenas desqualifica a cultura, como se a cultura não tivesse nenhuma relação com estes segmentos e como se a cultura tivesse menor importância e impacto sobre as necessidades da sociedade, principalmente se comparada a educação e a saúde.
No entanto, nas últimas duas décadas, muita coisa tem mudado em relação a isso, principalmente os conceitos e entendimentos do que venha a ser cultura e qual é o real papel do poder público nesse processo de fomento e preservação.
A sociedade moderna já descobriu e estabeleceu que cultura não é apenas arte. Arte é uma parcela importante da cultura, mas quando discutimos cultura estamos indo e atuando muito além dos limites da arte.
Cultura, dentro dos conceitos e concepções mais atuais, é tudo aquilo que tem relação com o ser humano. São as suas formas de expressão (entre elas a arte), as formas de ser, falar, andar e até de se vestir. Tudo aquilo que tem relação com o ser humano e a sociedade é hoje entendido como cultura. Inclusive, saúde e educação. (isso sem mencionar que comunicação é cultura, politica é cultura, turismo é cultura, economia é cultura)
Por isso a visão de que o Ministério da Saúde não existe só para atender aos médicos, assim como o Ministério da Cultura não existe somente para resolver as demandas da classe artística foi ampliada. Porque cultura não é só arte.
Esta percepção de que o MinC não é um balcão de atendimento exclusivo dos artistas, há muito tempo já esta sendo adotado pelo próprio Ministério, que sabe de sua obrigação de atender todos os setores da sociedade, inclusive os artistas.
A Moda, a Lei Rouanet e a Economia Criativa.
Recentemente temos observado certo espanto por parte de alguns profissionais de imprensa e até mesmo por pessoas de setores diversos, ao ver que a Lei Rouanet (aliás, desde 2009) autoriza a aprovação e o apoio de projetos de moda, assim como, projetos de arte digital e jogos eletrônicos (software livre).
As alterações dos últimos anos na legislação, tem trazido agora os primeiros resultados, no entanto, esta mudança foi um reflexo natural da transformação de conceitos e paradigmas que a sociedade está estabelecendo.
Isso não ocorreu de uma hora para outra.
Toda esta mudança foi consequência de inúmeras conferências, congressos, dentro e fora do Brasil, mobilizações da sociedade e do andamento das próprias politicas publicas de cultura. A Ministra Marta não acordou um belo dia e disse: Hoje vamos apoiar os projetos de moda!, apesar de que muitos acham que a coisa acontece assim.
No inicio dos anos 90, na Inglaterra, em meio a uma crise econômica que assolava o país (embrião e inicio da atual crise econômica mundial) os ingleses já perceberam que a mudança nos paradigmas da economia exigia uma nova postura do governo e da sociedade.
Nesse momento surge o conceito da chamada indústria criativa, que os ingleses passam a apoiar de forma mais efetiva por entenderem que esta traria reflexos importantes para a economia e o desenvolvimento social da sociedade britânica.
Os investimentos na chamada indústria criativa foram potencializados e os resultados começaram a surgir. Não só a queda do desemprego, mas também o aumento da produção econômica do país estavam relacionados a esta nova postura.
A chamada indústria criativa se baseia no desenvolvimento da cultura, do conhecimento e da criatividade como forma de desenvolvimento do cenário socioeconômico. Por isso, planos e programas específicos foram desenvolvidos buscando estimular o “mercado cultural”.
Aqui no hemisfério sul, esse conceito foi um pouco alterado e adaptado a realidade do terceiro mundo, e nós passamos a chamar isso de  ECONOMIA CRIATIVA.
Em poucas palavras, a ECONOMIA CRIATIVA buscava na cultura principalmente, uma forma de geração de empregos e renda, mas especialmente, uma forma de ampliar o chamado CAPITAL HUMANO. O Conhecimento, a cultura e a criatividade trabalhando em prol do desenvolvimento da sociedade.
Por isso no Brasil, nos últimos anos, muitos órgãos de gestão publica da cultura começaram também a encampar o fomento a indústria criativa.
A Secretaria de Cultura do Estado do RJ, mantem uma incubadora de projetos que tem por missão estimular o surgimento de empresas ligadas ao setor cultural, entre elas empresas ligadas ao audiovisual, ao universo dos espetáculos teatrais e shows, ao mundo das editoras, gravadoras, artesanato,  empresas de arquitetura, empresas de software e também, pasmem, a chamada indústria da moda, que hoje é um dos pilares da indústria criativa.
O próprio Ministério da Cultura, buscando se adequar aos novos tempos, criou dentro de sua estrutura administrativa uma SECRETARIA DA ECONOMIA CRIATIVA.
Por isso, aqueles que se assustaram ao perceber que a MODA hoje faz parte do leque da cultura, com certeza estão muito distantes destas discussões, e o mais importante, estas pessoas, assim como aqueles que questionaram o projeto da Maria Bethânia ou falam do Rock In Rio, acabam quase sempre somente criando um cenário de alarme que por vezes só faz aumentar aquele velho preconceito e descredito do setor cultural.  Afinal de contas, se a sociedade não sabe muito bem para o que serve a arte e a cultura, parece que muitas vezes nem mesmo aqueles que atuam de maneira mais próxima a ela sabem definir.
E assim, no embalo e na onda dos alarmistas de plantão, a moda hoje é criticar a Cultura, mesmo que seja sem muita informação e embasamento. Ouve-se falar e reproduzem sem reflexão aquilo que ouviram falar.
Não dá para negar que a moda esta dentro da cultura, mesmo percebendo que a valorização da cultura esteja um pouco fora de moda.

Texto de Marcelo Miguel
Poeta, produtor cultural e consultor em Gestão Cultural.
Coordenador da Quixote Art & Eventos
Ex- Coordenador do FÓRUM PERMANENTE DE CULTURA DO PARANÁ
Convidado e consultor do CONPAZ (Conselho da Cultura da Paz da Assembleia Legislativa do Paraná)
Integrante do Comitê de Cultura do BUNKYO (Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa – SP )
Colaborador da ONG Nheengatu (entidade de preservação e com atuação na defesa das populações indígenas - DF)
Integrante do Instituto Histórico e Cultural da Lapa PR