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27 de fevereiro de 2013

Homenagem a Moacyr Scliar


 
No dia 27 de fevereiro de 2011 perdíamos um grande médico e escritor, o sétimo ocupante da cadeira 31 da Academia Brasileira de Letras, recebido por Carlos Nejar.

Escreveu 74 livros, entre contos, ensaios, romances, inclusive literatura infanto-juvenil. Entre as obras mais importantes do autor, estão O ciclo das águas, A estranha nação de Rafael Mendes, O exército de um homem só. Seu livro O centauro no jardim, foi incluído pelo National Yiddish Book Center na lista dos 100 melhores livros de temática judaica dos últimos 200 anos.

Nasceu a 23 de março de 1937, no hospital da Beneficência Portuguesa, e o nome Moacyr já era um resultado da afinidade literária, pois foi escolhido por sua mãe após a leitura de Iracema, significando "filho da dor". Casou-se com Judith Vivien Olivien, com quem teve um filho, Roberto. Recebeu vários Prêmios Jabuti, e teve algumas de suas obras adaptadas para cinema e televisão.

Em 2002, envolveu-se em uma polêmica com o escritor do romance A Vida de Pi, vencedor do prêmio Man Booker, recentemente adaptado para o cinema e premiado no Oscar, acusado de ser um plágio da obra Max e os felinos. Scliar lidou elegantemente com o caso:
"Se a gente chama de plágio a apropriação de um texto alheio que é usado ipsis litteris então a resposta é negativa: não, Yann Martel não plagiou “Max e os Felinos”, mas ele usou a idéia do livro, com um enfoque diferente"

Disse em entrevista à Folha de São Paulo no ano de 2005.



Segue abaixo a última coluna escrita por Moacyr Scliar, no dia 11/01/2011, para o Jornal Folha de São Paulo.

Lágrimas e testosterona

Atenção, mulheres, está demonstrado pela ciência: chorar e golpe baixo. As lágrimas femininas liberam substâncias, descobriram os cientistas, que abaixam na hora o nível de testosterona do homem que estiverem por perto, deixando o sujeito menos agressivos. Os cientistas queriam ter certeza de que isso acontece em função de alguma molécula liberada — e não, digamos, pela cara de sofrimento feminina, com sua reputação de derrubar até o mais insensível dos durões. Por isso, evitaram que os homens pudessem ver as mulheres chorando. Os cientistas molharam pequenos pedaços de papel em lágrimas de mulher e deixaram que fossem cheirados pelos homens. O contato com as lágrimas fez a concentração da testosterona deles cair quase 15%, em certo sentido deixando-os menos machões.

(Publicado no caderno Ciência, 7 de Janeiro de 2011)
Ele vivia furioso com a mulher. Por, achava ele, boas razões. Ela era relaxada com a casa, deixava faltar comida na geladeira, não cuidava bem das crianças, gastava de mais. Cada vez porém, que queria repreendê-la por urna dessas coisas, ela começava a chorar. E aí, pronto: ele simplesmente perdia o ânimo, derretia. Acabava desistindo da briga, o que o deixava furioso: afinal, se ele não chamasse a mulher à razão, quem o faria? Mais que isso, não entendia o seu próprio comportamento. Considerava-se um cara durão, detestava gente chorona.

Por que o pranto da mulher o comovia tanto? E comovia-o à distância, inclusive. Muitas vezes ela se trancava no quarto para chorar sozinha, longe dele. E mesmo assim ele se comovia de uma maneira absurda.

Foi então que leu sobre a relação entre lágrimas de mulher e a testosterona, o hormônio masculino. Foi urna verdadeira revelação. Fina! mente tinha uma explicação lógica, científica, sobre o que estava acontecendo. As lágrimas diminuíram a testosterona em seu organismo, privando-o da natural agressividade do sexo masculino, transformando o num cordeirinho.

Uma idéia lhe ocorreu: e se tomasse injeções de testosterona? Era o que o seu irmão mais velho fazia, mas por carência do hormônio.

Com ele conseguiu duas ampolas do hormônio. Seu plano era muito simples: fazer a injeção, esperar alguns dias para que o nível da substância aumentasse em seu organismo e então chamar a esposa à razão.

Decidido, foi à farmácia e pediu ao encarregado que lhe aplicasse a testosterona, mentindo que depois traria a receita. Enquanto isso era feito, ele. de repente caiu no choro,um choro tão convulso que o homem se assustou: alguma coisa estava acontecendo?

É que eu tenho medo de injeção, ele disse, entre soluços. Pediu desculpas e saiu precipitadamente. Estava voltando para casa. Para a esposa e suas lágrimas.